Do Zero Hora
A devastação e o flagelo causados pelas drogas – o crack mais que todas as outras – levam a sociedade à impaciência. A violência inusitada causada pelo desespero dos dependentes ou pela perversidade dos traficantes e seus “soldados” chegou ao nível da insuportabilidade. A dor atinge de tal forma a quem perde um amigo ou parente pelas mãos assassinas, que a revolta e o desejo de punições mais severas apagam a distinção entre quem trafica e quem consome. A nada nos levará uma postura meramente repressora. É preciso ter força, eu sei, mas temos que ver uma vítima em um jovem acorrentado pela mãe para afastar-se da pedra-veneno, tanto quanto é vítima da drogadição aquele que chega ao ato tresloucado de um assalto para conseguir o dinheiro com que comprará a próxima dose.
Com o tráfico, nenhuma contemplação, nenhum perdão. Para os dependentes e usuários, medidas de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social. Frase que retiro da lei. A mesma lei que obriga o Estado a dispor de meios para o tratamento dos viciados. A mesma lei que autoriza União, Estados e municípios a conceder incentivos fiscais às pessoas e empresas que colaborarem na prevenção e na reinserção social. O texto legal refere o compartilhamento de responsabilidades e a colaboração mútua com o setor privado e os diversos segmentos sociais para inclusão de usuários, dependentes e seus familiares em programas de recuperação e tratamento. É a lei vigente, de 2006, que acrescenta o dever de atenção às parcelas mais vulneráveis da população e a consideração de suas necessidades específicas como princípios e diretrizes das atividades preventivas.
O Estado não cumpre nem repressão, nem prevenção. Esforça-se de forma comovente nas ações policiais e consegue bons números de prisões de narcotraficantes e apreensões significativas de drogas, mas o que faz na execução das penas é lamentável. Menos eficiente é a atividade preventiva ou terapêutica. O que se faz é muito pouco e corre por conta de instituições privadas. E é com um cenário assim que se pretende jogar em um mesmo buraco o traficante e seu cliente? Ninguém está disposto a comover e cativar a juventude com esporte, saúde, educação e afeto? Quando vamos tentar roubar a clientela dos traficantes? Se ainda não sabemos como fazê-lo, tentemos aprender.
Ainda não vi nada melhor que a campanha que, há mais de 30 anos, estampou em alguns outdoors da cidade a advertência mais séria: Senhores pais, adotem seus filhos antes que um traficante o faça! Não condenemos as famílias desses doentes, que hoje o drama é bem maior. Antes, a maconha. Havia cocaína e heroína, mas o que se expandia era a marijuana. Hoje, a pedra demolidora, o lixo de todas as drogas, o crack. Efeitos tão arrasadores quanto ligeiros. A advertência que ontem se fazia aos pais, faça-se hoje à sociedade e ao Estado. Os drogados são reféns, são vítimas. Hospital, comunidade terapêutica, lar e família é do que precisam. A cadeia que reserve suas vagas – que nem existem – para os traficantes impiedosos. Viciado é vítima.
*Jornalista
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