da Rede Bom Dia
Dentro de um bosque, escondida por entre as árvores, há uma porta amarela e um lembrete: “Quando abrir a porta você encontrará um mundo fantástico e cheio de sensações surpreendentes. Mas, não entre. Pode ser perigoso”. Qual o limiar entre a curiosidade e os perigos que o desconhecido oferece?
Essa curiosidade é apontada como principal motivo pelo qual as pessoas embarcam no mundo das drogas. Doses repetidas de prazer contidas em substâncias que, apesar de ilícitas, são facilmente acessíveis, é o principal motivo pelo qual as pessoas continuam nesse mundo.
O psicólogo especializado em dependência química, Cláudio Salviano, relata: “Tenho uma paciente que aos 60 anos se tornou viciada em craque. Ela nutriu uma curiosidade de usar drogas por toda a vida, mas quando experimentou, ficou viciada”, diz.
O caminho que uma pessoa faz da primeira experiencia com a droga até tornar-se um dependente químico passa por estágios de diferentes intensidades. Esse primeiro contato se dá normalmente pela maconha.
“A maconha é uma muleta para as outras drogas. Ela dá uma viagem e a pessoa cria o desejo de sentir cada vez mais a mesma viagem. Com o tempo ela vai criando uma tolerância e precisa de outras coisas para viajar.”
Não existe benefício no uso
Cláudio Silva explica ainda que a maioria da maconha consumida hoje é misturada com outras substâncias, o chamado “mesclado”: “Assim, com a própria maconha a pessoa já pode estar tendo seu primeiro contato com o craque, por exemplo”.
Pesquisas afirmam que a maconha é a droga mais consumida no mundo todo, sendo usada, muitas vezes como apoio por dependentes químicos em recuperação.
Para Salviano, além da curiosidade e do prazer, o que leva ao uso acentuado é a desinformação. “As pessoas difundem sem saber o que é.”
Apesar de utilizada em larga escala por todas as idades, as pesquisas indicam que principais usuários da maconha são os jovens.
Sandro Caramaschi, do departamento de psicologia da Unesp, afirma que o papel do grupo e as características de personalidade influenciam no uso ou não das drogas.
Uma das grandes polêmicas que envolvem a maconha está nas discussões sobre os seus efeitos. Para Salviano, ela é depressiva e perturbadora. Caramaschi rebate dizendo que consumimos diversas coisas que também fazem mal ao organismo.
Para os dois, no entanto, há um consenso. “Não existe nenhum benefício no uso”, diz Caramaschi. “Se fizermos apologia ao uso da maconha, logo as outras drogas serão usadas facilmente”, conclui Salviano.
‘Se eu pudesse, faria diferente’
O menino não traz na pouca idade metade das experiências de vida que tem. Mexendo as pernas, em sinal de inquietação, ele vai deixando de lado um pouco da timidez para dividir um pouco do que sente.
“Se eu pudesse, faria diferente. Agora eu já sei como é”, conta Paulo, 19 anos – o nome é fictício.
Paulo começou a usar drogas aos 14 anos. O primeiro contato que teve foi com a bebida, depois passou para o tabaco, para a maconha e chegou até a fumar craque.
“A primeira vez que eu fumei maconha foi numa festa com os amigos. Eu era muito tímido e queria me soltar. Depois disso, tudo que dava loucura eu usava”. Hoje ele tenta se recuperar na Comunidade Bom Pastor, de Bauru.
Ele não sabe dizer porque foi se envolvendo dessa forma, mas entre os relatos, vai deixando escapar bons motivos. “Meu pai era dependente também. Chegou a ficar internado aqui na Comunidade. Lá em casa a gente via muita coisa errada, agressões [...]. Ele saia de casa e ficava sumido por vários dias. A gente era criança e não sabia o que estava acontecendo, mas já tinha uma ideia. Quando eu provei, já tinha pré-disposição e gostei de primeira”. Como se quisesse esconder a realidade de si mesmo, Paulo prefere mudar de assunto.
Quando questionado sobre os pontos mais altos que chegou pela droga, o menino responde com pesar na voz: “Já cheguei a vender tudo o que tinha em casa para comprar droga. Eu vivia em função daquilo”.
Sobre o futuro, Paulo diz com firmeza que agora vai “sair dessa” e “mudar de vida”. Antes de terminarmos a conversa, ele levanta os olhos azuis e deixa escapar um único sorriso acanhado. “Não é só largar a droga, tenho que saber cuidar de mim”.
Comunidade recuperou 68% dos internos
A Comunidade Bom Pastor foi fundada em 1987. Hoje atende 30 internos, além de pacientes regulares. Entre os serviços que disponibiliza está um acompanhamento terapêutico e atividades como aula de tear e de cuidados pessoais.
Uma pesquisa interna mostrou que, de 2005 à 2007, cerca de 68% dos dependentes que procuraram tratamento na comunidade se recuperaram, 20% deles morreram e 12% obtiveram uma redução da intensidade da dependência. A Bom Pastor é mantida por doações e pela prefeitura. Ela fica na Rua Madré Cléria, no Jardim Cruzeiro do Sul. Para mais informações o número é: 3232-9580.
Nenhum comentário:
Postar um comentário