Fonte: Folha de São Paulo
As cenas de agressão policial a manifestantes da Marcha da Maconha e a jornalistas que cobriam o evento, na avenida Paulista, são resultado da visão embotada de alguns juízes, incapazes de distinguir entre a liberdade de expressão e a apologia ao crime.
A decisão de um desembargador de proibir a marcha não é a primeira. Desde 2008, a Justiça vem barrando manifestações semelhantes. O teor das decisões ao longo dos últimos anos é quase idêntico -alegam não se tratar de um debate de ideias, mas sim de uma iniciativa para o consumo público coletivo da maconha.
O argumento é falacioso. Os juízes não têm como saber, de antemão, se os participantes estarão lá para consumir substâncias ilícitas. Se isso vier a ocorrer, devem ser tratados de acordo com a lei vigente no país, mas a mera possibilidade não pode servir de base para a proibição de manifestação legítima a favor de uma ideia, por controversa que seja (legalização de droga considerada "leve").
Tais determinações judiciais parecem ignorar, também, que existe um debate muito mais amplo na sociedade, não restrito apenas a usuários e especialistas, em torno do que fazer em relação à complexa questão das drogas.
Relatório de 2009, de um grupo liderado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e por colegas da Colômbia e do México, defendia que a guerra às drogas fracassou e cobrava um debate público sobre alternativas, inclusive a descriminalização. No final do ano passado, foi o governador do Rio, Sérgio Cabral, quem se posicionou pela discussão acerca da legalização das drogas leves.
Proibições a manifestações pacíficas e sem objetivo declarado de ferir a lei não vão frear o debate. Servem apenas, como foi o caso em São Paulo, para favorecer a exibição de despreparo das forças de segurança, que agiram com inaceitável truculência, sob o pretexto de cumprir ordem judicial.
Duas ações no Supremo Tribunal Federal, em andamento desde 2009, contestam pontos da atual legislação empregados nas decisões dos juízes para proibir as manifestações por suposta apologia ao consumo de drogas.
O STF deve manifestar-se o quanto antes e cumprir sua função de garantidor da Constituição, que ampara de modo inequívoco o direito à liberdade de expressão.
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