Fonte: MTV
Oito anos após fazer barulho com um dos melhores discos de rap já produzidos no Brasil, o senhor Gustavo, de "codinome Black Alien", veio até a MTV Brasil, em São Paulo, pra anunciar de vez que em 2012 irá lançar DVD e disco inéditos, pra colocar seu nome com peso de volta no cenário ‘underground’ nacional.
"Aproveitando sua passagem de maneira útil", o ragga-rapper bateu um papo com o site da MTV sobre o que o novo disco promete na sonoridade, temática, e ainda jogou a real sobre o que pensa a respeito da violência policial nos morros do Rio e no Pinheirinho, sobre algumas mágoas do velho Planet Hemp, e ainda fez algumas críticas aos militantes da marijuana.
Leia abaixo:
E ESSE NOVO DISCO, SAI OU NÃO SAI?
Sai no início de abril. É bem autobiográfico, bem mais que o primeiro. São doze faixas com produção do Basa [Alexandre], Nave e LX – que produziu o disco da Flora Mattos. Tem muita guitarra, é um pouco mais rock ‘n’ roll. É uma biografia do que eu estou passando no momento, narrativo, nada é ficção. No primeiro disco, ‘O Informe’ era ficção, por exemplo, ‘1º de Dezembro’ já não era, ‘Como Eu Te Quero’ é ficção, ‘Pericia na Delícia’ é verdade, ‘Estilo do Gueto’ era real.
FALANDO EM ‘ESTILO DO GUETO’, E AS UPPs? E O BOPE?
Eu vejo assim: eles vêm e pacificam aquilo ali, e quando você pacifica, você tira a paz de outra comunidade, porque você está varrendo a sujeira pra debaixo do tapete. O que o bandido vai fazer? Concurso público? Cursinho? Vestibular? Vai para o supermercado carregar o carrinho das senhoras pra poder sobreviver? Não vai. Então o efeito é fake, aumenta o assalto à mão armada, aumenta o furto de carros, o assalto a pedestres, a quantidade de pedintes, ou seja, os caras de 1,90m, os negão com dois braços e duas pernas, que sabem falar, pedindo dinheiro na rua. Então eu acho que enquanto for varrer a sujeira pra debaixo do tapete vai ser uma bosta.
E O RAP COM ISSO?
A função do rap continua sendo denunciar esse tipo de coisa sim, contar as nossas mazelas – porque é um gênero em que a informação chega sem atravessador, não dá satisfação pro editor do jornal, ou pro dono da gravadora, a informação vai direto pro interlocutor – mas a gente pode falar de outras coisas também porque é arte, e na arte você fala o que você quiser. Mas a principal função, que é uma coisa que o governo não faz, é informar o povo, e é isso que a gente continua fazendo.
ACHA QUE HOUVE ABUSO NO PINHEIRINHO?
Sim! Abuso! Eu fico bolado porque quem é da PM ali que nasceu na Suécia? Então os próprios PMs saem batendo no povo e esquecem que são aquilo ali também. Quem eles pensam que são? Mas essa é a história do povo brasileiro até a hora que ele se levantar de verdade. As senhorinhas lá da Argentina, quando sobe 25 centavos o pãozinho, vão lá na frente da Casa Rosada e fazem um panelaço, e o brasileiro não tem esse costume de revoltar e ir pra rua e reclamar de verdade, sem caô. E eu tento fazer o meu trabalho. Tem uns versos que eu anotei sobre o Pinheirinho que vão estar no disco novo e é isso que eu posso fazer. Se eu pudesse largar o dedo nesses caras aí eu largaria, mas isso não posso fazer, então só escrevo.
COMO EX-PLANET, COMO VOCÊ VÊ A VIOLÊNCIA NA MARCHA DA MACONHA?
Os caras queriam o quê, meu irmão? Por que eu não fui nessa passeata? Ah, vai ser bobo também lá na China! Não queriam levar uma paulada? Os caras ficam fumando maconha na cara da polícia, ficam xingando a polícia, e não querem tomar uma cacetada? Aqui é Brasil, amigo. Aqui teve uma Ditadura Militar que acabou outro dia. Então acho uma puta de uma ingenuidade. Eu já fui preso por isso ai, inclusive não tem graça nenhuma, e nego tá brincando com fogo e sem base. Tem que estudar melhor as bases pra poder sair falando as coisas, e isso foi um erro que o Planet inteiro cometeu, falar as coisas sem base. E se você for ver bem, nenhuma das letras que eu fiz pro Planet falam de maconha. Nem ‘Queimando Tudo’, porque se eu não tenho base pra falar eu não falo nada. Mas isso já é um caso do Planet, onde eu era músico contratado.
E ESSA PRISÃO?
Não era nem pra eu ter sido preso no caso. Eu era músico contratado, não tinha nenhuma letra minha ali, só tava no trabalho. Então os caras atiraram no xerife e atiraram no ajudante do xerife também, que era eu. ‘I shot the sheriff’, você atira na instituição, ‘But I did not shoot the deputy’, você não atirou no cara que está ali ralando porque tem que ralar.
VOLTAR PRO PLANET. ALGUMA CHANCE?
Pro Planet eu não estou afim de voltar não, cara. Cantar aquelas mesmas letras, que são coisas em que eu não acredito mais. O tempo passou, o assunto não é tão relevante assim. Como qualquer assunto sério, ele também não pode ser levado tão a sério. E o Marcelo [D2] não fala nada comigo. Naquele show de 20 anos da MTV ele não deu satisfação nenhuma, não falou nada, ficou tudo meio estranho, e eu tinha show marcado, então quer dizer, nego tem que chegar pelo menos com certa delicadeza, e vir falar comigo com respeito, direito, sobre o que é aquilo: ‘Gustavo, quero você na volta, eu posso te pagar tanto’. Porque ninguém me falou nada, eu acho que nego não me tratou com respeito, então eu vou deixar pra lá. Sinto muito pelo público, porque acho muito divertido. Mas são coisas que eu não acredito mais.
E A CENA DO RAP CARIOCA?
A cena do Rio de Janeiro está ótima, como eu nunca vi. Acho que é a melhor cena desde o auge da zoeira, em 1998. Em 2011 eu vi um outro auge, vi a cena fervendo de novo. Com Gutierrez, com Auri, com Xará. Eu to achando a cena do Rio muito boa, porque abriram casas também. Antes era ou pra 3000 pessoas ou pra 300. Agora tem casas pra 500, 700 pessoas.
DIFERENTE DO RAP PAULISTANO?
Não, eu não acho não. Porque São Paulo também tem muito samba, e samba da melhor qualidade. Aquilo que falaram sobre o túmulo do samba é besteira, até quem falou foi um gênio, que deve ter só dado uma agulhada ali. Eu acho que o rap com samba veio antes do Marcelo D2, e veio com um cara chamado Rappin Hood, e, no entanto, o Rappin Hood é paulistano. Então esse negócio de que no Rio tem mais ou menos pandeiro, eu não percebo isso. Mas eu acho sim que no Rio se usa elementos de outras culturas, de outras músicas, mais do que São Paulo. Mas aqui [em São Paulo] você também tem um cara que é o Criolo, que também usa várias influências de outros gênios, do caralho.
VOCÊ PARTICIPOU DO DISCO DO FORFUN, CERTO?
Sim, foi muito legal, os moleques são muito responsa. Adorei. Eu gosto do som deles, acho eles muito inteligentes e muito cultos pra idade. Eles tem um lado maloqueiro, maconheiro, xoxoteiro, e tem um lado intelectual, lêem bastante. O público deles é muito legal. Também fiz parceria com o Shawlin, André Ramiro, Marcio Local, Oriente, e as próximas eu prefiro deixar no sapatinho (risos). Aliás, acho que Manu Chao você pode colocar sim.
E NO SEU DISCO NOVO, ALGUMA PARTICIPAÇÃO?
Provavelmente o Kamau, que vou chamar com certeza. Eu tava pensando no Ogi, que fez o melhor disco de 2011 na minha opinião, e no Terra Preta. Esses dois não sabem ainda que vão ser convidados. Tem uns medalhões também da MPB que são surpresa, mas que na hora a galera pode se surpreender, mas vai se surpreender para o bem.
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