Fonte: Última Instância
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou nesta quarta-feira (23/11) o modo como foi conduzida a recente crise sobre a presença da Polícia Militar no campus da USP (Universidade de São Paulo) e recriminou a rotulação dos estudantes que ocuparam a reitoria da instituição como “maconheiros”.
“Certamente considerá-los maconheiros foi um absurdo e não faz nenhum sentido. O modo como foi permitido o episódio aqui [na USP] deu à sociedade a sensação disso”, disse FHC a Última Instância, após participar de um debate sobre a crise internacional no GACInt (Grupo de Análises da Conjuntura Internacional) da USP.
Fernando Henrique, que tem defendido publicamente o debate sobre a descriminalização das drogas, classificou o modus operandi da polícia no caso como “repressivo”. “A repressão faz mais mal do que o uso da maconha”, afirmou o ex-presidente.
FHC, que também foi professor da USP, defendeu a reforma do estatuto da universidade. “Acho que o estatuto deve ser repensado, bem como toda a educação universitária. Esta é uma boa oportunidade para isso”.
O caso
Apesar de a discussão sobre o convênio entre a PM e a reitoria ser mais antiga, a tensão aumentou em 27 de outubro, quando três estudantes da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) foram abordados no estacionamento da instituição sob a alegação de porte e consumo de cigarros de maconha. A ação desencadeou tensão entre estudantes e policiais e foi seguida de uma ocupação da administração da faculdade.
No dia 1º de novembro, reivindicando o fim do convênio entre a PM e a USP, bem como a renúncia do reitor João Grandino Rodas (Nomeado para o cargo pelo então governador José Serra, sem que fosse o mais votado nas eleições), um grupo composto por 73 estudantes ocupou o edifício da reitoria, contrariando deliberação de Assembleia-Geral e o posicionamento oficial do Diretório Central dos Estudantes, o DCE.
A reintegração de posse ocorreu sete dias depois, mediante operação policial que contou com batalhões da Tropa de Choque, da Cavalaria, do GOE (Grupo de Operações Especiais) e do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais). Também dois helicópteros da PM permaneceram sobrevoando a cidade universitária por toda aquela manhã. No mesmo dia uma nova Assembleia ocorreu na FFLCH e deliberou a greve dos estudantes, que permanece até hoje em algumas faculdades.
Leia trechos da entrevista de Fernando Henrique Cardoso:
Última Instância - A USP vive um momento de convulsão, sabemos que existem diversas movimentações políticas que questionam a maneira como a reitoria tem se portado perante o corpo discente. O sr. acredita que já é o momento para que o estatuto seja reformulado?
Fernando Henrique Cardoso - Estou afastado da USP há muito tempo. A última vez que dei aula aqui foi em 1968, e nós já discutíamos isso. Formamos uma comissão paritária e fizemos modificações no estatuto. Quando voltei pra dar um curso na década de 1970, a USP estava novamente discutindo o estatuto. Acho que o estatuto deve ser repensado, bem como toda a educação universitária. Esta é uma boa oportunidade para isso.
Última Instância - O que o senhor pensa sobre parte da opinião pública ter rotulado os estudantes da USP como maconheiros, mantendo o “tabu das drogas”?
Fernando Henrique Cardoso - Certamente considerá-los maconheiros foi um absurdo e não faz nenhum sentido. O modo como foi permitido o episódio aqui deu à sociedade a sensação disso.
Última Instância - A seu ver, esse “modo” foi repressivo?
Fernando Henrique Cardoso - O modo como foi conduzido? Sim. Sou contra a manutenção do tabu das drogas e a favor de uma regulação. E ela não pode se destinar apenas ao universitário, mas a toda a sociedade. A repressão faz mais mal do que o uso da maconha.
Última Instância - A PM é a melhor alternativa para a segurança pública na USP?
Fernando Henrique Cardoso - Não sei em que termos é feito esse policiamento, mas certamente a Polícia de Choque não é a mais indicada.
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