Fonte: Correio Braziliense
Enquanto líder do PT e ex-integrante da equipe de Dilma apoiam declarações do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre entorpecentes, responsáveis por programas federais evitam o assunto
A discussão da política sobre drogas no Brasil ganha força novamente com o lançamento do documentário Quebrando o tabu, que entra em cartaz nesta sexta-feira, em Brasília. No filme, Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP), que comandou o Palácio do Planalto entre 1995 e 2002, conta por que agora, diferentemente da época em que era presidente, é a favor da descriminalização de todos os entorpecentes. A produção traz ainda depoimentos de formadores de opinião de vários lugares do mundo concordando com a posição do tucano. Sobre isso, o Ministério da Justiça opta pelo silêncio.
A titular da Secretaria Nacional de Política Sobre Drogas (Senad), Paulina do Carmo Arruda Vieira Duarte, foi procurada pelo Correio para comentar a posição oficial do governo sobre o assunto, mas não retornou. O Ministério da Justiça avisou que não se pronunciaria sobre o assunto. O único integrante da equipe de Dilma Rousseff a falar sobre a questão foi o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Em entrevista ao Fantástico exibida ontem, ele afirmou que a rede de atendimento para dependentes químicos ideal teria de contar com 3,5 mil leitos hospitalares, 900 casas de acolhimento e 150 consultórios de rua. Essa estrutura só deve ser concluída, porém, em 2014. “Nós, do Sistema Único de Saúde (SUS), precisamos reorganizar essa rede e ampliá-la para acolher usuários de drogas, sejam lícitas ou ilícitas”, disse.
O líder do PT na Câmara, Paulo Teixeira (SP), defende a regulação restrita da produção de drogas. Para ele, o caminho não seria a legalização, mas a criação de uma estratégia para esvaziar o poder econômico do mercado de drogas. “Basicamente, eu defendo que se transfira a questão das drogas da esfera criminal para a área da Saúde. Falo de regulação da produção e de atendimento ao usuário. Não de legalização. É preciso mudar, ainda que haja a necessidade de passos lentos e cuidadosos”, ressalta.
Indicado para assumir a Senad em janeiro deste ano, Pedro Abramovay, ex-secretário nacional de Justiça, deixou o Ministério da Justiça antes mesmo de ser nomeado. A saída dele teria sido motivada por uma declaração na qual defendia penas alternativas para pequenos traficantes. Até hoje, Abramovay prefere não falar sobre o caso porque, segundo o próprio, desvia as atenções de um assunto maior e mais importante, que é a política sobre drogas. Ele continua discordando da posição do governo.
“A questão da descriminalização não passa somente pela vontade de um país. Não dá para ser um movimento solitário e não se pode tratar todas as drogas da mesma maneira. Acho saudável que essa discussão esteja acontecendo. Do jeito que a legislação é atualmente, há mais danos que benefícios. No Brasil, prendem-se muitas pessoas que estão mais próximas de serem usuárias que traficantes, e a lei de 2006 criou uma ilusão de país liberal, o que não existe”, comenta. “O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, no fim do ano passado, que é possível conceder penas alternativas. Jogar qualquer um envolvido com drogas na prisão é suicídio”, completa.
A legislação brasileira proíbe o consumo e a comercialização das drogas. Apesar da Lei nº 11.343 de 2006 determinar penas mais brandas para usuários do que para traficantes, o número de presos envolvidos com entorpecentes continua aumentando. Esse é apenas um dos argumentos usados pelo ex-presidente, por ex-integrantes do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e por parlamentares da base aliada de Dilma Rousseff.
Consciência
“Só quem é burro não muda de opinião diante de fatos novos. Eu não tinha consciência da gravidade e do que significava essa questão naquela época como tenho hoje”, diz FHC, no documentário. Ele explica também que a pressão norte-americana influenciava diretamente as medidas tomadas. De acordo com ele, a guerra contra as drogas nos moldes que tem sido feita até hoje fracassou.
Para ilustrar exemplos bem-sucedidos, Fernando Henrique viaja por países que adotam posturas diferentes das brasileiras em relação ao problema. Em Portugal, por exemplo, todas as drogas foram descriminalizadas e o acesso ao tratamento dos dependentes foi expandido. Com o tempo, o aumento do consumo tornou-se o menor da Europa.
Na quinta-feira, FHC participa de uma conferência da Comissão Global e Política Sobre Drogas, nos EUA, para defender alterações na política mundial. O grupo é formado por nomes expressivos, como Kofi Annan, ex-secretário-geral da Organização das Nações Unidas; Mario Vargas Llosa, escritor peruano e vencedor do Prêmio Nobel de Literatura; e Paul Volcker, ex-presidente do Banco Central norte-americano.
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