Especialistas, porém, alertam que, até agora, o comprovadamente positivo é não beber
Uma taça de vinho por dia faz bem ao coração; um copo de cerveja pode ajudar a melhorar a performance de um atleta; mulheres que consomem bebida alcoólica regularmente não engordam: não param de surgir pesquisas sobre benefícios do álcool consumido moderadamente, mas o embate continua. Do outro lado da balança, estão as consequências que o organismo pode sofrer por causa do excesso, essas sim comprovadas há anos pela ciência. Os estudos dos supostos benefícios são recentes e, portanto, precisam de uma comprovação mais ampla. Para os médicos, a melhor opção ainda é não beber. Para aqueles, porém, que não conseguem ficar longe da cervejinha gelada ou de um bom vinho, a ordem é moderação.
O consumo excessivo de álcool aumenta o risco de danos a vários órgãos, como o fígado e o cérebro, e também o risco de acidentes cardiovasculares. “Para qualquer médico, seria irresponsável recomendar mais de dois drinques por dia para os homens e um para as mulheres. Muitas pessoas bebem vinho por causa dos antioxidantes e dos flavanoides. Mas o melhor é fazer a suplementação de outra forma, através da alimentação ou em cápsulas. Minimizar o consumo de álcool é sempre a melhor opção”, disse ao Correio Lindsay Brown, professora da escola de ciências biomédicas da Universidade de Queensland, na Austrália.
Segundo a médica australiana, entre os estudos recentes existem evidências epidemiológicas de que as pessoas que bebem moderadamente, de uma a duas taças de vinho por dia, podem diminuir o risco de doenças cardiovasculares. A suposição é de que os polifenóis flavanoides, encontrados na bebida à base de uvas, podem ter ações positivas. Nos anos 1990, a mídia americana incentivou estudos sobre a substância, que poderia evitar doenças cardiovasculares, diabetes e obesidade. “Por causa disso, temos mais de 3 mil publicações científicas sobre o assunto. Por isso, há um aumento de indícios que comprovam benefícios contra outros problemas. Sabemos muito mais do que há 10 anos, mas ainda há muito a aprender sobre todos os nutrientes do vinho”, afirma Lindsay.
Benefício “mental”
Uma taça depois do almoço e outra após o jantar são suficientes para Olavo Tadeu Câmara, 56 anos. “Aprendi a tomar vinho muito cedo, antes mesmo de ir para a escola”, brinca. “Cresci em Andrado, no interior de Minas, e morávamos perto de uma vinícola.” Atualmente, as degustações ficam restringidas a no máximo três vezes por semana. Para o arquiteto, que faz atividades físicas e tem acompanhamento médico regularmente, o vinho pode trazer benefícios mais para a saúde mental do que para a física. “É um momento para relaxar e estar tranquilo. Acredito que a bebida possa ter seus benefícios, mas nada de exagero. O organismo responde da forma como você o trata, e o vinho pode servir como complemento disso”, afirma.
Para o sommelier Paulo Kunzle, 47 anos, a sentença também é verdadeira. Há um ano, ele descobriu que tem tendência a ter um nível muito alto de plaquetas e usou o vinho como forma de terapia. “Conversei com o meu médico e tomei todas as precauções. Descobri que o vinho estava me ajudando esse tempo todo, porque ele tem propriedades que ajudam a afinar o sangue e dilatam as artérias”, comenta. Hoje, ele toma religiosamente duas taças por dia. E é um dos maiores defensores do hábito. “Uma das principais vantagens do vinho são os antioxidantes. Basta tomar como exemplo a região de Bordeaux, que tem um baixo índice de mortalidade por problemas cardíacos, e cada habitante consome, em média, 60 litros da bebida por ano. Meu conselho é sempre escolher os tintos secos, porque os suaves têm um conservante chamado sorbato de potássio.”
O vinho tem mais de 2 mil componentes. Um litro tem 14mg de resveratrol, um polifenol considerado essencial para a saúde, segundo os cientistas. É pouco provável, no entanto, que se possa obter uma quantidade suficiente com a bebida para reduzir significamente o risco de doenças cardíacas. “Os polifenóis ou outras tantas substâncias podem ter contribuído para os resultados positivos em estudos experimentais, mas nós simplesmente ainda não temos nenhuma evidência detalhada sobre essa assunto”, explica Lindsay.
Dieta
Um estudo divulgado na semana passada e muito comentado na internet e pela comunidade médica sugere que mulheres que bebem álcool regularmente têm menos tendência a engordar. A autora do estudo, Lu Wang, do departamento de Medicina Preventiva do Brigham and Women’s Hospital, de Boston, nos Estados Unidos, explicou ao Correio que o ponto de partida da pesquisa foi o fato de que mais de metade dos americanos consome bebidas alcoólicas. Itens como vinho, cerveja ou vodca eram considerados fontes de energia que, a longo prazo, poderiam resultar em ganho de peso. “No entanto, não foi possível obter evidências consistentes de que o consumo de álcool apresenta um risco para o desenvolvimento da obesidade”, comenta a especialista.
Os cientistas calcularam a ingestão de álcool com base no consumo de bebidas descrito em um questionário respondido por 19.220 mulheres, todas com 39 anos, livres de doenças cardiovasculares, câncer e diabetes e que tinham peso normal. O acompanhamento foi feito, anualmente, durante 13 anos. Segundo Lu Wang, não foi possível obter dados concretos para explicar por que o consumo de álcool pode influenciar no peso, mas descobertas de outros estudos podem oferecer algumas explicações plausíveis.
O álcool ajuda o próprio corpo a estimular o processamento da energia. Mas de nada adianta exagerar na dose, apenas com moderação é possível perceber algum efeito. “Entre as mulheres, aquelas que têm consumo leve a moderado de álcool normalmente têm uma ingestão menor de calorias de fontes não alcoólicas. Por outro lado, a ingestão de álcool tende a induzir o aumento do gasto de energia, além da caloria consumida através da bebida. Isso pode explicar o resultado do nosso estudo. Existem também outros mecanismos pelos quais o álcool pode modificar o peso corporal. Incluindo o efeito do álcool na absorção e digestão de nutrientes, interferência na oxidação dos lipídios e acumulação de gordura”, sugere Lu Wang.
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